sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Conexões

(caio silveira ramos)

Brontops Baruq é um dos grandes autores brasileiros modernos.  Avesso à fama, ele possui uma identidade secreta como o Bruce Wayne do Batman.  Mas não faz isso por ser enjoado. Faz por modéstia. Mesmo assim, já é famoso nos círculos da literatura de ficção-científica, ainda que se dê bem escrevendo em qualquer gênero. Além de ser um magnífico desenhista.
Conheci Brontops olhando o verso de umas fotos de viagem: para cada imagem captada pela câmera, ele ilustrava a situação que a gerara, a história por trás daquela fotografia, e tudo se tornava ainda mais interessante. Depois ilustrou um continho meu. E enfim, descobri que ele também escrevia e tinha – talvez fruto de uma bagagem de conhecimento profundo, que não excluía nem a “cultura pop” – uma criatividade espantosa.
Não sei o porquê, mas enquanto escrevia uma série de três crônicas intitulada “Não sou de briga”, para o “Mirante dos Infinitos”, pensei em dedicá-la ao Brontops. Estranho isso, porque ele é uma pessoa pacífica, tranquila, avessa a se meter em qualquer polêmica.  Talvez tenha pensando nele porque as crônicas, para ilustrar as situações narradas, fizessem menção a séries e desenhos dos anos 1980, assuntos que Brontops domina também.  Mas provavelmente não era esse o motivo, pois é difícil encontrar algum assunto que Brontops não domine. E sempre sem qualquer pingo de afetação ou pretensão.
A razão da homenagem talvez fosse uma perda recente na vida da identidade secreta de Brontops, mas como a dedicatória não combinaria com o título da série – o que teria a ver “Não sou de briga” com a tristeza de uma partida? – resolvi não fazer nas crônicas qualquer menção ao seu nome.
Mas assim que acabei de enviar ao Jornal a terceira e derradeira parte da série, encaminhei a Brontops as duas primeiras crônicas, revelando minha intenção inicial de dedicar a ele aqueles textos. Brontops achou graça, fez alguns comentários sobre o enredo e acabei me despedindo dizendo que assim que fosse publicada, eu encaminharia a terceira parte por e-mail, para que ele, pelo menos, pudesse apreciar as ilustrações da incrível Maria Luziano.
A última parte enveredava por caminhos estranhos ao enredo das crônicas anteriores e tratava do conflito terrível de um eu-menino que, para reforçar as desculpas de um malfeito contra um amigo, acabava por se desfazer de um querido carrinho de bombeiros, ainda que isso provocasse algum arrependimento.  Publicada a crônica, a encaminhei ao Brontops, que me respondeu: “eu tenho esse brinquedo!”. E alguns dias depois, para comprovar, ele me enviou o tal carrinho de presente.
E ali, diante de mim, estava um brinquedo idêntico ao que eu me obrigara a dar de presente a um amigo-menino, em 1978: um carrinho de bombeiros “de ferro”, da marca Matchbox, vermelho, com detalhes prateados e com uma escada amarela que subia e descia.
A conexão estava feita: estranhamente, seguindo um caminho tortuoso, a crônica que imaginei dedicar (sem saber por qual razão) ao escritor Brontops, revelava enfim suas intenções.  Ela era veículo de uma amizade entre meninos.  Meninos novos, meninos velhos.
Meninos eternos.


Ilustração de Maria Luziano - cedida pelo Jornal de Piracicaba
Publicada no Jornal de Piracicaba em 9 de setembro de 2017


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